Quando falamos em superstições, pensamos em comportamentos relacionados com sorte e azar, como achar um trevo de quatro folhas ou passar debaixo de uma escada. Nesse texto, vamos ver como, às vezes, lidamos com nossas emoções e pensamentos dessa mesma maneira.
No começo do século XX, havia um pesquisador americano, B.F. Skinner, que propôs um experimento ousado: criar superstições em pombos. Para fazer isso, ele programou uma máquina que liberava um grão de comida para o bombo de X em X tempo, suponhamos, 20 em 20 segundos, independente do que o pombo fizesse. No entanto, foi observado que os pombos passaram a repetir o comportamento que estava sendo emitido naturalmente no momento da primeira liberação de comida.
Ou seja, se ele estava bicando a gaiola, ele continuou bicando, e logo recebeu mais um pouco de comida, gerando a “crença” – entre aspas, porque o pombo não tem capacidade de criar essa “frase” em seu pequeno cérebro – de que ele estava recebendo alimento porque ele estava bicando a gaiola. Por isso, surgiram os comportamentos mais inusitados: alguns passaram a bater as asas, outros a ficar em um pé só, outros começaram a girar sobre o próprio eixo.
Superstição, em psicologia comportamental, é todo comportamento que o sujeito acredita ser causa de um evento que, na verdade, aconteceria de qualquer maneira. Mas o que isso tem a ver com as nossas emoções?
Para começar, podemos lembrar daquelas ocasiões em que tivemos uma “intuição” de que algo ia ou não acontecer, ou que tal pessoa não tinha um bom caráter e estávamos certos ou errados. Se nós devemos seguir ou não a nossa intuição, isso é tópico para uma outra conversa.
No entanto, há uma confusão comum entre intuição e emoção. Logo, algumas pessoas passam a acreditar – mesmo que não falem isso explicitamente – que a presença ou ausência de determinada emoção é sinal de que algo de bom ou de mau vai acontecer (normalmente de mau).
Vamos a alguns exemplos para ilustrar essa situação.
Uma pessoa que tem a ansiedade como emoção mais frequente vai ter várias perguntas pairando em sua cabeça: “Será que vai dar certo?”, “Mas e se algo de ruim acontecer?”, “O que será que os outros estão pensando?”. Isso acontece porque a ansiedade é uma emoção relacionada com o receio de um mal futuro, uma ameaça que ainda não se concretizou no presente, mas já foi detectada, e por isso existe a dúvida.
Não é incomum que essas pessoas tomem a ansiedade que sentem como uma evidência de que essa ameaça que temem que aconteça de fato vai acontecer. Isso acontece porque acreditamos que nossas emoções se relacionam de forma direta com a realidade, o que não é verdade. Nossas reações emocionais são intermediadas pela nossa percepção do mundo, transcrita em nossos pensamentos, que, por sua vez, podem fazer uma série de erros de leitura da realidade, que chamamos de erros cognitivos.
Por exemplo, uma pessoa diagnosticada com TOC pode pensar muitas vezes se trancou ou não a porta de casa ao sair. Ao se sentir ansioso – o que é inevitável, com tantas dúvidas pairando na cabeça -, conclui que essa sensação é evidência de que ela está destrancada, e volta para conferir. Por trás disso, há uma regra: “Se ela estivesse mesmo trancada, eu não estaria tão ansioso”, o que não é verdade, já que a ansiedade surge a partir dos pensamentos de dúvida sobre a porta estar trancada ou não, e não a partir do estado real da porta. Esse ciclo é ainda mais reforçado depois que a pessoa volta e confere se a porta está trancada, sentindo uma redução dos sintomas de ansiedade, e seu cérebro ainda lhe diz: “Viu? Quando você sabe que a porta está trancada, você fica tranquilo. Logo, se você está ansioso, é porque ela está destrancada”.
É claro que, colocando nesses termos, parece um tanto absurdo. Mas é fato que muitos pacientes com um funcionamento ansioso chegam em conclusões sobre o mundo externo a partir de suas próprias sensações internas.
E como sair dessa armadilha?
Entendendo que nossas sensações internas (coração apertado, coração acelerado, mão suando, sensação de pressão baixa, calor, fome, sono, cansaço) não são evidência de nada no mundo externo, que funciona independente do que nós estamos sentindo.
Pensar na solidez do mundo à nossa volta, nos dar conta de que as coisas existem com ou sem a nossa autorização, que são nossos pensamentos, emoções e comportamentos que devem se ajustar ao mundo concreto, e não ao contrário, pode ser um fator de proteção contra as superstições das emoções.
Para praticar:
Observe as coisas ao seu redor, no seu trabalho. Você já pensou que elas continuam existindo mesmo quando você volta para casa?
Nesse mesmo sentido, pense em algum lugar para onde você já viajou, o mais distante de todos. Agora, lá, as pessoas andam na rua, se divertem, trabalham, dormem, independente do que você faça aqui.
A realidade é nossa amiga, pois é somente nela que podemos encontrar a segurança para nos orientarmos. Quanto mais presentes estivermos nela, mais felizes seremos, necessariamente!
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