Na última semana o Brasil inteiro acompanhou estupefato, o resultado das chuvas principalmente nos Estados do Rio, Minas e São Paulo. No Rio são mais de 650 mortos, e em Minas são 17 mortos e 82 cidades decretaram situação de emergência. São Paulo, Paraná e Santa Catarina sofreram com os alagamentos. Esses eventos catastróficos que podem envolver ameaça à vida são grandes geradores de crise. Então a pergunta é: como lidar com ela?
Todo ser humano passa por várias situações de crise durante a vida, crise no relacionamento, no trabalho, nos estudos, crise gerada pela morte de um ente querido, e crises geradas por fatalidades, ou desastres naturais como é o caso. Uma crise se caracteriza pela dificuldade ou impossibilidade que uma pessoa encontra em resolver problemas utilizando seus recursos e métodos usuais, o que causa geralmente resultados inesperados sejam eles positivos ou negativos. A crise na maioria das vezes é temporária, mas não é incomum se prolongar ou até mesmo tornar-se uma sobrevida para alguém. O fator de temporalidade contribui para o término da crise, pois entender que esse é um momento difícil que passará, possibilita uma motivação para continuar lutando, o que provavelmente ajuda a vencer as dificuldades com mais facilidade. Ao passo que pensar na crise como uma constante, fará dela parte da nossa vida, o que provavelmente gerará uma desesperança com relação ao futuro podendo causar uma desmotivação para viver. Isso é o que eu denomino sobrevida, estar vivo e não conseguir aproveitar as oportunidades e ou até mesmo rejeitar as soluções que aparecem avaliando-as como “imperfeitas” ou falhas.
Os últimos acontecimentos no Brasil propiciaram que várias pessoas e famílias vivenciassem uma crise. Essas pessoas perderam não só entes queridos, mas perderam suas casas e principalmente seus sonhos. Essa catástrofe gera um desequilíbrio psicológico causado pela constatação do risco real corrido e pela incapacidade de enfrentamento do problema, o que gera ansiedade. É muito comum nessas situações cognições como: “ O que será de mim agora?” ou “Porque Deus foi permitir que isso acontecesse logo comigo?” ou “ O que eu fiz de errado para merecer isso?” .
Essas perguntas são perguntas sem resposta o que gera ainda mais ansiedade e torna o sofrimento circular e acaba colaborando para uma rigidez cognitiva que contribui para o sofrimento.
Mesmo pessoas mais flexíveis e equilibradas não estão isentas de vivenciar uma crise numa situação como essa. É fato que essas últimas têm uma tendência a saírem com mais facilidade da crise, mas isso não é determinante. Erikson dizia que as crises não são necessariamente negativas, mas pontos de crescimento. Quantos testemunhos positivos temos de pessoas que vivenciaram crises?O campeão olímpico de vela Lars Grael é uma dessas pessoas. Ele teve uma perna amputada depois de uma acidente e não apenas voltou a velejar como faz parte, atualmente, da equipe permanente de vela olímpica. O que dizer, então, sobre o pianista João Carlos Martins que perdeu grande parte do movimento das mãos e voltou a tocar e hoje desenvolve um projeto de popularização da música clássica e de inclusão social através da formação musical de jovens carentes e é regente da Filarmônica Bachiana Sesi/SP? Esses são grandes exemplos de superação, de pessoas brilhantes que mesmo após uma crise continuam sendo brilhantes. Mas aí dirão; “eu não sou como eles, então não tenho capacidade de sair da crise”. Mas existe alguém igual a outro alguém? Quantas pessoa “normais” não se tornaram atletas paraolímpicos depois de acidentes? Quantas outras não encontraram um sentido de vida na ajuda humanitária, ou ajuda ao próximo depois de uma perda irreparável e sentem felizes assim.
Podemos sim fazer diferença! Tanto quem ajuda como quem é ajudado. Se a crise for encarada como passageira e nos envolvermos em novos planos de vida, mudamos a nossa realidade e muitas vezes também as realidades dos que nos cercam. É bem verdade que num primeiro momento, criar um sentido de vida, é praticamente impossível, pois a demanda é por necessidades básicas. Mas a solidariedade alheia faz muita diferença para essas pessoas. A ajuda, o conforto e a segurança oferecida por outros direciona a uma estrutura que pode minimizar os danos causados pela tragédia. É pena que muitas vezes essa solidariedade só perdura por algum tempo, mas ela pode ser determinante para que a pessoa ajudada possa superar a crise mais tarde. O comprometimento e solidariedade permitem com que as pessoas se sintam amadas, queridas e especiais, mesmo que elas não tenham tido vínculo anterior com o sujeito da ajuda, o que pode criar uma força interna que os motiva a seguir em frente e agradecer por estarem vivos e ainda quem sabe, algum dia, até mesmo se perceberem fortes, capazes e únicos com uma missão a cumprir?
E quem está fora da zona de risco pode perguntar: E eu com isso? Nós mesmos, expectadores da crise alheia também nos tornamos vulneráveis quando começamos a avaliar se corremos os mesmos riscos que afetaram outros. Se avaliarmos negativamente os nossos recursos de enfrentamento para uma suposta situação podemos nos deparar com uma crise. Compreender que ao nos atormentar com perguntas sem resposta ficaremos mais vulneráveis e inaptos para a solução do problema pode ajudar na mudança de paradigma. Para que perder tempo com o que não se pode responder? Tratemos de nos questionar sobre o que nos compete, o que NÓS podemos fazer. É tudo uma questão de custo e benefício, e escolha. Eu posso escolher me fixar nas perdas ou posso escolher alcançar novos objetivos. Eu posso escolher ajudar e me beneficiar com essa atitude, porque quem ajuda sente-se gratificado pela atitude, ou continuar parado me omitindo levando a vida de sempre. A decisão é nossa.

Dedico este post à Cris Guerra e a tantos outros que tem ajudado pessoas a sair da crise com seu exemplo de superação e vida.