Você se questiona: Quando essa pandemia vai acabar? Quando vou poder tomar a vacina? Quando vamos voltar a ter uma vida normal? Questiona-se também: Se eu adoecer? Se pessoas que amo adoecerem? E se eu me contaminar e passar a doença para alguém da minha família? Se essa nova cepa for mais grave? Se a vacina não servir para as mutações do vírus? Se eu perder o emprego? Se eu não tiver dinheiro? Se a crise econômica piorar?
Tenho ouvido essas perguntas constantemente no consultório, e apesar delas serem bem comuns a verdade é que não temos resposta para nenhuma delas e se ficarmos focados apenas nas incertezas na tentativa de prever o futuro imprevisível para evitarmos consequências negativas, a nossa ansiedade aumentará trazendo-nos prejuízos.
Nesse vídeo respondo algumas dúvidas sobre ansiedade
A ansiedade é uma emoção natural e necessária para todos nós e pode ser bem utilizada quando conseguimos acolhê-la devidamente. Ela coloca o nosso corpo em estado de alerta para nos ajudar a sair de uma situação de risco e perigo. Entretanto, quando não a utilizamos para buscar resolução com ações que dependem de nós, não é incomum nos preocuparmos com o futuro numa tentativa inglória de não termos prejuízos potenciais.
Quando não buscamos estratégias de solução para a ansiedade ou o medo associados à problemas que não temos controle ou garantia, como quando a vacina chegará ou se iremos ou não adoecer, entramos num looping ansioso que fragiliza o nosso organismo e diminui a nossa resposta positiva.
Tenho ouvido médicos relatarem observação de casos agravados do Covid em pessoas que apresentam uma maior aversão à possibilidade de adoecer. O que na realidade faz sentido, do ponto de vista psicológico, pois quanto maior for a avaliação de risco sem a avaliação de recursos adequados, maior o estresse.
O estresse que estamos vivenciando tem sido cada vez mais reforçado por notícias catastróficas, que levantam problemas e oferecem poucas soluções, o que faz com que as pessoas se sintam desesperançadas, desenergizadas, ansiosas e depressivas.
Então, o que poderíamos fazer para melhorar a nossa resposta biológica e utilizar a ansiedade de forma mais efetiva e ter menos chances de complicações caso venhamos nos contaminar com o vírus?
Beck, criador da Terapia Cognitivo Comportamental e seus colegas Emery e Greenberg utilizam uma fórmula que ajuda a medir e ajustar a ansiedade:
Essa fórmula demonstra que quanto mais superestimamos a ameaça e subestimamos a nossa capacidade de enfrentamento, maior será a nossa ansiedade negativa. Quanto mais focarmos nos riscos e menos nos recursos de enfrentamento e resgate, maior será a ansiedade e, consequentemente, a resposta fisiológica.
A ameaça faz com que o nosso corpo reaja e produza adrenalina, noradrenalina e cortisol para nos proteger de eventuais perigos. O problema deve-se, em maior parte, ao excesso de cortisol liberado quando os recursos e resgastes não são devidamente avaliados e o corpo entra num estado de alerta mais prolongado.
O cortisol é extremamente importante para combater infecções e inflamações, mas pesquisas como a da Universidade de Carnegie Mellon, nos Estados Unidos, mostram que em excesso o cortisol pode fragilizar o sistema imunológico, deixando o organismo insensível a essa substância e o corpo mais propenso a inflamações.
Por outro lado, ver uma probabilidade de risco pequena poderá ser prejudicial também. Para ilustrar: Achar que o Coronavírus não é tão complicado assim e por isso deixar de usar recursos preventivos como lavar mãos, manter um distanciamento ou usar máscaras, ou pensar que não vai pegar a doença, porque não está saindo de casa. Ambas são avaliações perigosas: a primeira expõe mais a pessoa ao risco de contágio e a segunda funciona de forma preventiva apenas para diminuir as chances de adoecer, mas não garante a não contaminação. No caso de adoecimento, portanto será provável que ambas entrem num elevado stress, uma vez que, em nenhum dos dois casos elas terão criado recursos de enfrentamento para a doença.
Então, o que poderíamos fazer para elevar a avaliação dos recursos e resgastes a fim de utilizar melhor a resposta biológica da ansiedade?
A vacina é um excelente resgate a caminho, mas infelizmente ainda não é algo viável para todos. O que seriam então os recursos que poderiam ajudar na esfera psicológica desde já? Os recursos ideais precisam contemplar além das ações de prevenção de contaminação as ações de controle individual que contribuirão para o combate da doença no caso de contaminação pelo Coronavírus. Por exemplo: ações que priorizam o fortalecimento do sistema imunológico como, suplementação de vitaminas D, C e zinco, prática de atividade física, sol, alimentação saudável e equilibrada e sono de qualidade.
Essas ações além de fortalecerem o sistema imunológico, reforçarão uma atitude mental positiva que contribuirá para a superação da doença. Mesmo que o indivíduo faça uma avaliação de risco e tenha aversão a se contaminar pela doença, ter feito a prevenção através do fortalecimento imunológico contribuirá para validar a crença de que ele tem mais condições de enfrentar o vírus porque tomou as precauções que lhe cabiam, e estará, portanto, com sua saúde reforçada para vencer a doença.
Reconhecer o autocuidado e reforçar a ideia que o seu organismo está mais preparado aumentará sua percepção de recursos e diminuirá a ansiedade negativa, facilitando sua recuperação.
Outro exemplo de prevenção e recursos são as ações como lavar as mãos, respeitar o distanciamento social e usar corretamente as máscaras. No entanto, essas medidas são apenas preventivas e funcionam para minimizar as chances de contágio, mas não contribuem para o enfrentamento da doença em caso de contaminação pela Covid.
Já as ações relacionadas ao fortalecimento do sistema imunológico servem para as duas situações e, portanto, seriam muito úteis se fossem ainda mais divulgadas e estimuladas.
Um outro tipo de resgate além da vacina, poderia ser ter um médico de confiança e acesso a tratamentos da doença em si, e acompanhamento de doenças preexistentes. Além disso, quem sabe até mesmo um tratamento logo no início dos sintomas. O meu objetivo aqui não é entrar no mérito da discussão da comprovação científica ou não de certos tratamentos, mas oferecer possibilidades de resgate disponíveis que representam uma tentativa, pois como disse um tio médico sobre a fala de um professor de Stanford: “a ausência de evidência não é sinal de evidência de ausência”. De qualquer forma é sempre bom lembrar que não é recomendável que as pessoas façam uso de medicações sem o acompanhamento de um médico.
Ainda do ponto de vista psicológico, supondo na pior das hipóteses que esses tratamentos não tenham eficácia, ainda assim servem como resgate para os pacientes que acreditam, e mesmo que sejam um placebo, esse resgate torna-se uma esperança e pode diminuir o estresse, melhorando o humor e promovendo a resposta imunológica. Dessa forma, fará uso da ansiedade como um recurso de promoção de saúde mental, criando prevenção.
Quando os recursos e resgate são retirados ou omitidos pela mídia dizendo que nada trata nem resolve, que a vacina vai demorar, gera-se um estresse crônico social, pois as pessoas não verão nem recursos, nem resgate de enfrentamento do problema. O estresse pode agravar em muito o quadro, visto que a pessoa só irá avaliar riscos e aumentará sua aversão ao temido evento.
Importante esclarecer que a falta da ansiedade e do medo também não é positivo, pois sem essas emoções o indivíduo pode ficar displicente e não tomar as precauções necessárias para se proteger e vencer a doença. Colocar os recursos nos outros, no futuro ou situações que não podem ser controladas por nós como ficar tentando adivinhar o “quando” a vacina chegará, só aumentará a resposta ansiosa negativa.
Não acreditar e nem usar nenhum recurso enquanto se está doente e se observa o desencadeamento dos sintomas só contribuirá para o aumento do stress negativo e menos resposta imunológica e consequentemente probabilidade maior de agravamento da doença.
É possível usar a ansiedade em seu favor, veja aqui!
Concluindo: para se utilizar a ansiedade favoravelmente é necessário criar recursos concretos e cada um pode criar os seus, mas é importante lembrar que os recursos mais eficazes de enfrentamento são aqueles que promovem para uma atitude mental positiva de enfrentamento do problema caso ele ocorra.
Compreender essa fórmula contribuirá para tirar o foco atencional dos riscos externos e das soluções “perfeitas” que não existem, levando a nossa atenção e energia para ações viáveis e resolutivas.
Deixar de focar em soluções externas que não podemos controlar, reforçando nossos recursos individuais que façam sentido para cada um de nós, ajuda-nos a criar uma força emocional sem precedentes. Portanto, enquanto a vacina ainda não está disponível para todos, poderíamos ter um número bem menor de casos agravados da doença se estimulássemos as pessoas a buscarem novos recursos e resgate para o enfrentamento do Covid.