Hoje li uma notícia muito triste sobre o suicídio de um jovem chamado Guilherme durante a sua apresentação de TCC. Segundo a reportagem o jovem teria se matado após receber “duras críticas desmerecendo, segundo informações, toda a carreira acadêmica do jovem”. O jovem era estudante de direito e ao que parece tinha estagiado na defensoria pública que manifestou-se dizendo que o jovem “era conhecido pela sua competência, dedicação e humanização no atendimento”. Nas redes sociais as pessoas pedem justiça pela morte do garoto. Isso na realidade é uma reação normal quando uma tragédia acontece. Existe uma tendência das pessoas a buscar culpados pelo acontecimento, como se isso pudesse contribuir para uma diminuição do mal- estar. Um suicídio ou uma morte mexe muito com as pessoas que ficam tentando encontrar formas de explicar o inexplicável. O fato é existia já um sofrimento que provavelmente não foi indentificado e portanto não pôde ser evitado. Essa impossibilidade de prevenir ou evitar algo que as vezes nem foi sinalizado gera um questionamento sem fim e culpar alguém torna-se muitas vezes uma saída mais rápida desse loop sem resposta. Não quero aqui isentar de responsabilidade a professora em questão, apesar de não termos o conteúdo real das suas palavras para fazermos algum tipo de julgamento, mas é sempre bom lembrar também que afinal existem várias formas de se fazer críticas, e um pouco de amor, generosidade e delicadeza não fazem mal a ninguém. Por outro lado, gostaria de propor aqui uma outra reflexão. Quantos jovens temos visto tomando esse tipo de atitude diante de frustrações acadêmicas? Não seria o caso do Guilherme, talvez o sintoma de um adoecimento da sociedade que vivemos? Há alguns anos tenho percebido na minha prática clínica um elevado crescimento de jovens se queixando e julgando fracassados com elevados índices de depressão, ansiedade e desesperança aliados a uma alta intenção suicida.
E foi exatamente por observar o aumento de ocorridos como o dele que fui fazer o meu mestrado em Relações interculturais em Lisboa. Eu queria compreender o que significava a ideia de fracasso coletiva fui primeiro pesquisar o conceito de sucesso. Compreendi que a ideia coletiva de sucesso diferia da ideia individual de sucesso. Uma vez que no coletivo veríamos o sucesso relacionado com o poder, dinheiro, status e resultados, no individual víamos uma ideia de bem-estar, equilíbrio e busca por dignidade. Mas quando os jovens se diziam fracassados eles não estavam espelhados no conceito individual, mas sim no conceito coletivo e por isso estavam tão frustrados. Eles queriam atingir os padrões externos extremamente elevados e estavam desconectados de si mesmos. Os jovens quando estavam em sofrimento estavam apenas observando o conceito de sucesso externo e não estavam em contato com as suas necessidades, valores e sentido. Essa desconexão gerava sofrimento e uma cobrança e julgamento excessivos e extremamente negativos. Nesse mesmo trabalho me deparei com a teoria do mindset. De acordo com a APA o primeiro princípio da psicologia para a educação seria: “Crenças e percepções dos estudantes sobre a capacidade afetam seu funcionamento cognitivo e aprendizagem”. Existe uma professora americana chamada Marva Collins que por ter um “mindset de crescimento” e acreditar que a capacidade não é inata, mas sim desenvolvida, acreditou nos seus alunos anteriormente classificados como incapazes pelo sistema e os tornou profissionais capacitados e e bem-sucedidos (até mesmo dentro do conceito externo de sucesso). O que a teoria do mindset propõem em linhas gerais é que o “mindset fixo” apresenta uma tendência a ver a capacidade como algo inato que não pode ser melhorado( ou seja se nasci inteligente assim permanecerei, sem necessidade de me aprimorara e se eu nasci burro eu assim também permanecerei), e por outro lado o “mindset de crescimento” vê a capacidade como algo em processo continuo que pode ser sempre melhorado e desenvolvido. De acordo com essa teoria o esforço seria o caminho para o aprendizado e os fracassos, erros e insucessos seriam fonte de aprendizado para o futuro. Pensando assim o fracasso não seria um fim em si, mas uma oportunidade de crescimento. O que vi acontecer com o rapaz foi exatamente o que eu vinha observando tanto na prática individual, como no coletivo coletado pela minha pesquisa. Pelo que parece o jovem era dedicado, estudioso e bom aluno e provavelmente aprendeu que o “o esforço obrigatoriamente traz resultados”, o que na realidade é uma inverdade e uma distorção. O esforço contribui para você ter um bom desempenho, mas não determina. Compreender que o esforço tem que ter resultado faz a pessoa se interpretar como burra e fracassada quando o resultado esperado não é alcançado com o esforço. Portanto o para ajudarmos essa população mais jovem a alcançar um mindset de crescimento teríamos que ajudá-los (como grupo social) a tirar o foco do resultado e colocar o foco no aprendizado e desenvolvimento, pois somente assim os jovens conseguiriam ter mais resiliência aos erros, fracassos e frustrações.
Profissional Responsável: Renata Borja Pereira Ferreira de Mello | Psicóloga – CRP: 04/13403.
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