Todas as vezes que abro um jornal ou alguma revista de notícias semanal tenho a sensação de que as notícias sangram e que nós leitores ficamos cada vez mais expostos e vulneráveis. Outro dia li uma reportagem em que o pesquisador afirmava que a violência nos tempos atuais é a mais baixa de todos os tempos. Quase não pude acreditar, afinal, as notícias nos mostram o contrário. Mas os números não mentem…. Esse fato me levou a seguinte conclusão: Se a violência tem diminuído apesar de tantas evidências contrárias, podemos ficar mais esperançosos a respeito do futuro e das pessoas. Talvez seja muito irrealista pensar assim, mas é uma opção que dentro da minha proposta otimista pode fazer alguma diferença.
Trazendo isso para a TC e sabendo que a tríade cognitiva se dá entre mim, o mundo e o futuro penso que temos boas perspectivas. O problema é que talvez as notícias estejam nos paralisando demais, pois o excesso de informações pode acabar nos deixando vulneráveis se superestimarmos as ameaças e subestimarmos a nossa capacidade de enfrentamento nas situações.
Penso que vulnerabilidade gera vulnerabilidade e se não rompermos esse ciclo ficaremos reféns, de nós mesmos, do mundo e do futuro. O que o mundo precisa é amor e se amarmos e ajudarmos os nossos pacientes a seguirem amando poderemos entrar num ciclo virtuoso que tudo pode. Acredito que existe uma falta de ação generalizada liderada por pensamentos que envolvem risco, ameaça e desesperança. A vulnerabilidade é um fato. Algo de ruim pode acontecer comigo a qualquer momento e eu não tenho como evitar, nem controlar. Não adianta eu remoer sobre o pior, porque se o pior tiver que acontecer não foi por que pensei que poderei evitá-lo. Eu não posso prever o que acontecerá, mas mesmo se pudesse, muitas vezes ainda faríamos diferente do planejado e quem sabe até melhor. Lembrei-me então de um fato ocorrido comigo há exatos 11 anos: Eu estava saindo da clínica num sábado de manhã juntamente com uma paciente quando fomos abordadas por um rapaz complemente drogado que exigiu o dinheiro que tínhamos conosco. Detalhe: eu estava grávida de 8 meses. Ao abrir a minha bolsa observei que estava sem carteira e sem dinheiro algum. No entanto eu tinha uma maçã embrulhada num plástico e prontamente eu respondi assim: – Meu filho! É uma pena, mas eu não tenho nada disso hoje, agora, eu tenho algo melhor para você. E tirei da bolsa a tal maçã. Ele prontamente se virou para mim e perguntou: E como fica o bebê? Se referindo ao meu bebê devido a minha enorme barriga. E eu respondi: Não tem problema, eu estou indo para casa mesmo e você agora precisa mais do que eu. Incrivelmente ele sorriu e foi embora comendo a maçã e ainda me dando adeus. A minha paciente ainda em estado de choque olhou para mim ainda meio sem entender o que tinha acontecido, pois afinal depois da minha oferta ele se esqueceu do assalto e ela não chegou nem a dar o dinheiro que ele tinha pedido.
Hoje avaliando meus pensamentos sobre aquele momento percebo que ao me deparar com o problema parti para a resolução sem dúvidas de uma forma serena e tranqüila e o resultado foi inquestionavelmente melhor do que se eu tivesse previsto o incidente.
Numa outra reportagem com criminosos presos observei uma constante no relato de todos eles. A maioria falava que alguma reação súbita da vítima tinha causado a agressão ou até mesmo o assassinato. Os criminosos quando vão para uma ação eles já se programam antecipadamente para a reação de fuga ou luta da vítima e qualquer gesto de susto poderá ser interpretado como uma ameaça para eles. O ciclo vicioso da vulnerabilidade se instala dessa forma: criminoso vulnerável + vítima vulnerável = violência. No entanto, se a vítima tiver uma reação tranqüila e pacificadora, pode ser que ela consiga desconsertar o agressor que não está preparado para esse tipo de resposta.
Voltando aos dados sobre a diminuição da violência, entendo que esse fato tenha ocorrido pela diminuição de mortes em guerras, por outro lado, penso que a violência urbana, pelo menos no Brasil, tem aumentado devido ao “incentivo” dado pela própria mídia, além do pequeno contingente da polícia e a falta de leis adequadas na condenação do criminoso. Pensando dessa forma voltamos para o problema: Somos vulneráveis, o mundo é perigoso e futuro é incerto. Sim, eu sou vulnerável. Mas pensar sobre isso não me faz deixar de sê-lo. Convido todos vocês a movimentarem mais do que nunca para tornarmos essa pesquisa sobre a diminuição da violência real no meio urbano brasileiro, encontrando no amor a solução para a vulnerabilidade. Tudo bem se o mundo não é como eu gostaria, tudo bem se eu não posso prever o que irá me acontecer, o que importa é o que eu posso agora e futuramente, e eu posso amar.
Renata Borja